Justiça decide que sargento transexual retome o direito de usar roupas femininas na Marinha do Brasil

A decisão em 1ª instância do juiz federal Daniel Chiaretti, da 1ª Vara Federal de Corumbá, no Mato Grosso do Sul, determinou que a sargento transexual da Marinha do Brasil Alice Costa, de 31 anos, seja indenizada em R$ 80 mil pela União por danos morais. Além disso, a militar retomará o direito de adotar o nome social e utilizar o uniforme feminino.

Segundo a sentença, Alice foi imposta a “padrões masculinos” de forma discriminatória, e afastada sem motivos dos serviços pela Marinha do Brasil em agosto de 2021.

A União argumentou, no decorrer do processo, que quando a militar prestou o concurso para entrada na corporação, as vagas previstas eram exclusivamente masculinas. Porém, o juiz descartou a justificação.

“Ao simplificar a questão desta maneira, a União está desconsiderando todas as angústias demonstradas nos documentos médicos. A transição ocorreu anos após o ingresso, não é o caso de se falar em qualquer burla ao sistema de concursos ou de promoção no serviço público”, analisou o magistrado.

Segundo Chiaretti, a situação é “absolutamente excepcional” e não gera impacto expressivo na organização.

Para o magistrado, a imposição de padrões masculinos de apresentação física e a utilização do nome e sexo de nascimento são discriminatórias, pois de acordo com Opinião Consultiva 24/2017, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a mudança do nome e a adequação dos registros e documentos são protegidos pela Convenção Americana de Direitos Humanos.

“A premissa fundamental no presente caso é o direito à igualdade, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal e em diversos tratados internacionais A partir daí, temos um mandamento proibitivo de discriminação, consagrando assim a existência de um direito antidiscriminatório que conta com amplo alicerce convencional”, pontuou.

O juiz destaca, por fim, o parecer do Supremo Tribunal Federal (STF) que implica que a identidade de gênero deve ser respeitada em acordo com os direitos fundamentais garantidos pela Constituição.

“Se o indivíduo for tolhido, em qualquer das esferas sociais que participa (família, trabalho, religião), de portar-se de acordo com seu senso corporal, não estará exercendo sua humanidade na totalidade, tampouco lhes serão plenos os direitos sociais, caso tenha que optar, por exemplo, entre sua identificação de gênero e o trabalho”, concluiu.