Economistas afirmam que crise política terá impacto no PIB de 2022

BRASIL – Com a crise política impulsionada pelos atritos do presidente Jair Bolsonaro com outros poderes a economia foi diretamente afetada. Com a desvalorização do real frente ao dólar, encarecendo alimentos e combustíveis, a perspectiva é de juros mais elevados e crescimento mais tímido em 2022, segundo economistas.

Além da crise política outras crises se somam a este cenário, como a fiscal, sanitária, energética e até de abastecimento, devido à paralisação de caminhoneiros e também à falta de alguns insumos provocada pela pandemia de covid-19. Do lado das soluções, governo e Congresso ainda não apontaram uma solução para viabilizar o Orçamento de 2022, hoje um dos principais focos de incerteza.

Ninguém sabe ainda qual será o real tamanho do Auxílio Brasil, sucessor do Bolsa Família, e quanto da fatura de R$ 89,1 bilhões em dívidas judiciais (precatórios) será paga no ano que vem. Um juro elevado esfria a economia e prejudica o crédito e a volta do emprego.

A incerteza também se reflete no dólar. Depois das manifestações de 7 de Setembro, a moeda americana chegou a valer R$ 5,32, mas foi abaixo de R$ 5,20 quando foi divulgada a declaração mais amistosa de Bolsonaro. Na última sexta-feira (10), o câmbio voltou a subir e fechou em R$ 5,26. A subida do dólar acelera a inflação – movimento que o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), chamou de “looping negativo”. Na sexta, o próprio Bolsonaro admitiu que suas falas vinham tendo efeito no câmbio. “Se o dólar dispara, influencia o combustível”, disse.

Para o economista André Braz, coordenador de índices de preço do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), o dólar deveria estar abaixo de R$ 5, mas a combinação de crises impede que se rompa essa barreira agora. “A carta, ainda que tenha melhorado o humor da Bolsa, não vai reverter esse clima de incerteza. Porque o próprio eleitorado do Bolsonaro vai fazer pressão, quer que mantenha o discurso. Isso não permite que a incerteza diminua.”

O impacto do dólar chega muito rapidamente à população, porque o consumo doméstico de alimentos concorre com as exportações. Embora o Brasil seja um dos maiores produtores de soja e carne do mundo, a alta no preço desses produtos no mercado externo leva os agricultores e pecuaristas a vender para quem paga mais. Também afeta o preço dos combustíveis, que ainda sofrem o impacto do valor internacional do petróleo.

Braz também observa que a economia brasileira ainda é muito indexada, isto é, a inflação de hoje serve de referência para corrigir preços nos períodos seguintes. É assim com salários, aluguéis, mensalidades escolares e plano de saúde. Por isso, o movimento observado em 2021 já contamina as expectativas para a inflação do ano que vem, gerando a expectativa de uma atuação mais firme do Banco Central – ou seja, um juro ainda maior.

Pelo menos metade da inflação de 2021 é determinada por componentes energéticos: energia elétrica, gás encanado ou em botijão e combustíveis. Muitos são puxados pelo dólar, mas também, no caso da eletricidade, pela crise hídrica que ameaça o abastecimento e levou o governo a instituir uma cobrança adicional. E a energia afeta outros produtos ou serviços.

Para Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse Brasil, o superávit comercial brasileiro e a abundância de recursos nas mãos de investidores internacionais deveriam jogar a favor do País, mas não é o que se observa. “A curva de juros continua muito pressionada e o câmbio poderia estar muito melhor pelos fundamentos de balança comercial e o ambiente global muito líquido”, avalia.

Solange chama a atenção que a incerteza atrapalha também o controle das expectativas, o que tem afetado a própria inflação. Segundo ela, as tensões que elevam o prêmio de risco do Brasil vão chegar à economia real via crédito, porque a taxa de juros de longo prazo está acima de dois dígitos para 2025.

Para uma trégua nesse ambiente, ela recomenda a votação da PEC dos precatórios, com parcelamentos das dívidas judiciais, e a definição do novo Bolsa Família, de forma a reduzir as incertezas sobre as contas públicas do País. Mas a economista reconhece que nenhum alívio durará muito tempo.